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Traumas na infância aumentam o risco de transtornos mentais? O que um estudo da Universidade de Sydney diz e o que não diz sobre você?

Atualizado: 7 de dez.

Traumas na infância aumentam o risco de transtornos mentais?

 

      Por que esse tema importa tanto hoje? Nos últimos dias, ganhou repercussão um estudo da Universidade de Sydney indicando que pessoas que passaram por traumas na infância teriam até 50% mais risco de desenvolver transtornos mentais na vida adulta. A manchete impressiona — e pode assustar. Vivemos um momento em que a sociedade está cada vez mais consciente dos impactos emocionais das vivências precoces, mas também mais vulnerável a interpretações fatalistas.

 

      Por isso, este artigo é um convite à reflexão fundamentada: o que esse estudo realmente significa? Ele determina o destino emocional de uma pessoa? E, principalmente, o que a ciência e a clínica mostram sobre resiliência, superação e possibilidades de cura?

 

1. O que o estudo realmente investigou?

 

      O estudo analisou quase 16 mil adultos e encontrou associação entre traumas infantis e maior probabilidade de:

 

• ansiedade

• depressão

• abuso de substâncias

• transtornos relacionados ao estresse

 

      No entanto, e aqui está o ponto fundamental: o estudo é observacional. Ele identifica correlação, não causalidade, ou seja, ter vivido trauma não significa que a pessoa desenvolverá, inevitavelmente, um transtorno mental.

 

      A própria análise científica reconhece que muitos fatores — sociais, genéticos, ambientais, afetivos e culturais — influenciam o desenvolvimento emocional de cada indivíduo.

 

2. Trauma não é destino: a importância do olhar clínico

 

      Como psicóloga clínica há quase 20 anos, você percebe algo que a ciência também confirma: as pessoas possuem forças de caráter que podem transformar profundamente o impacto da dor. Martin Seligman, fundador da Psicologia Positiva, afirma que “o ser humano não é apenas a soma de suas vulnerabilidades; ele é também potência, significado e possibilidade.” Na mesma linha, Viktor Frankl nos lembra que: “Entre o estímulo e a resposta existe um espaço. E é nesse espaço que reside nosso poder de escolher.”

 

     Ou seja, ainda que a infância influencie, ela não determina quem a pessoa será. Fatores que reduzem drasticamente os efeitos do trauma:

 

• vínculo afetivo com ao menos uma pessoa estável

• ambiente emocionalmente seguro na adolescência

• suporte social

• fé, espiritualidade ou senso profundo de propósito

• habilidades cognitivas de reestruturação

• acesso à psicoterapia

• características individuais de resiliência

 

      A neurociência chama isso de plasticidade neural: o cérebro é capaz de reorganizar conexões mesmo após experiências de dor.

 

3. Por que as manchetes podem distorcer a compreensão?

 

      Quando um estudo diz “aumenta em 50%”, isso não significa “50% das pessoas terão transtornos”. Significa que, estatisticamente, existe uma maior chance relativa. Mas chance não é destino. É como dizer que “dirigir na chuva aumenta o risco de acidente” — mas milhões de pessoas dirigem com chuva e sem acidentes todos os dias. O risco é maior, mas não é determinante.

 

4. O que vemos na clínica: a possibilidade da ressignificação

 

Muitos adultos que passaram por traumas na infância desenvolvem:

 

• maturidade emocional elevada

• empatia profunda

• capacidade de acolher o outro

• senso de justiça

• espiritualidade

• força para construir relações mais saudáveis do que as que viveram

 

      Essa é a dimensão existencial e transformadora da vida psíquica que nenhum estudo consegue capturar completamente. E quando o trauma deixa marcas, a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental oferece ferramentas potentes para ressignificação:

 

• reestruturação de crenças nucleares (“eu não sou digno de amor”, “o mundo não é seguro”)

• compreensão dos esquemas formados na infância

• técnicas de exposição e processamento emocional seguro

• treino de habilidades sociais

• mindfulness e autorregulação

• desenvolvimento de novas narrativas internas

• construção de propósito e sentido

 

5. Exemplos e orientações práticas para quem viveu traumas na infância

 

Se você ou alguém próximo viveu experiências adversas, saiba:

 

✔ Você não é definido pelo que aconteceu - Trauma explica, mas não determina. Ele é um capítulo, não a história inteira.

 

✔ Buscar apoio é um ato de força, não de fraqueza - Cuidar da mente é um investimento em liberdade emocional.

 

✔ Sua história pode ser reescrita - Com apoio psicológico, novas escolhas são possíveis, novos vínculos podem ser construídos, e novas formas de existir podem nascer.

 

✔ A resiliência é treinável - Ninguém nasce pronto. Resiliência é desenvolvida — na terapia, nos vínculos, na espiritualidade e na construção de sentido.

 

A que conclusão chegamos?

 

      O estudo da Universidade de Sydney é sério e importante — mas precisa ser compreendido com profundidade e responsabilidade clínica. Ele revela tendências, não destinos. Mostra risco, não condenação. E reforça algo essencial: com apoio adequado, é possível viver uma vida emocionalmente saudável, mesmo após experiências difíceis.

     

Se você sente que seu passado ainda ecoa no presente, a psicoterapia pode ser o caminho de ressignificação, cura e reconstrução. Se quiser dar esse passo, estou aqui para caminhar com você.

Vamos juntos construir uma vida emocional mais leve, consciente e cheia de significado.


Ana Cláudia Melo – Psicóloga Clínica


 


 
 
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